quarta-feira, 8 de maio de 2013

Página móvel com texto fixo, de Adão Contreiras


   Decorreu há poucos dias a sessão de apresentação do livro Página móvel com texto fixo, de Adão Contreiras, edição 4Águas, com prefácio de Fernando Esteves Pinto.
   O autor, até agora mais conhecido no meio das artes plásticas e visuais, surpreende-nos com esta escrita em que  as palavras são sujeito e objecto, irrompendo espontaneamente, sondando o mistério da sua (nossa) génese e sentido.

            … São como fósforos
            acendendo-se na mente
            as palavras que nascem
            involuntárias

            penso

   Em cento e um « parágrafos », as palavras de AC interpelam o universo. Nomeiam coisas tão concretas, como sol, terra, pão, luz, chão. Convocam emoções e ideias como espaço, tempo, amor, memória,  crença, pensamento. E transcendência.

    As palavras interrogam. Dialogam. São uma âncora numa realidade em constante mudança.
    Estão mortas no dia a dia e vivem no pensamento dos poetas, diz o autor.
    Mas nestes « parágrafos », as palavras  também são matéria lúdica, ironizando, por vezes rimando, outras  fazendo negaças, outras ainda produzindo sons que se repetem, tudo para brincar, quando estão bem  dispostas.
   Algumas são suspeitas: os adjectivos,  por  irromperem da fraqueza da escrita.
   Contudo, as palavras agradecem -lhes o agasalho, como bem se explica num « parágrafo » mais à frente :

                                                 (…)
                       Isso é uma espécie de manto ou véu brilhante
                       que se põe por cima das palavras.

                       E porquê ?
                       Ora, porque as palavras às vezes têm frio e outras vezes têm calor

                       penso

   As palavras são um corpo. Por vezes entre parênteses
   As palavras de Adão Contreiras pensam e pensam-no. Pensam-nos.
   Pegando no Décimo segundo parágrafo, para terminar : existir é pensar o universo. Mesmo que ele não  pense em nós.

         Marcela Vasconcelos

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